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Análise BD: Cobra – Operação Conacri – Tomo 1 – Por uma Guiné Melhor

A Guerra Colonial Portuguesa marcou significativamente mais que uma geração de portugueses. Passados 50 anos do seu fim, será que finalmente acabou o luto e se começa a falar naturalmente do assunto? Uma das formas pode ser através da BD. Leiam aqui a análise ao livro Cobra – Operação Conacri – Tomo 1 – Por uma Guiné Melhor.

A guerra é algo que deixa sempre cicatrizes profundas num país. Atualmente a guerra Israelo-Palestiniana e a da Ucrânia deixam diariamente marcas cada vez mais profundas. Mas, no século XX, a França e o Reino Unido ficaram marcados com as duas Guerras Mundiais em menos de meio século. Os E.U.A. ficaram marcados com a Guerra do Vietname. E os Portugueses ficaram marcados pela Guerra do Ultramar.

Este é um tema que ainda continua muito sensível. Apenas passaram 50 anos desde o seu fim e o mesmo ainda suscita muita discussão e muitas leituras nem sempre isentas. Documentários, filmes, artes plásticas, obras literárias e BD foram influenciadas por este tema, das formas mais diversas.

Mas as gerações mais novas começam agora a olhar para a Guerra Colonial como um episódio da história dum país, que pode servir de base para várias obras artísticas sem ter de inevitavelmente resultar num juízo de valores. Finalmente começam a surgir obras com uma visão crítica e isenta e não apenas com uma formatada visão anticolonial.

Recordo que, no universo da BD portuguesa, tivemos em 2021 Os Vampiros de Filipe Melo e Juan Cavia, e ainda mais atrás, em 2012, As Cinzas da Revolta de João Amaral; mas agora surge uma série mais estruturada, composta por uma trilogia e baseada em factos e personagens reais.

O primeiro volume, que decorre na Índia, leva-nos aos incidentes que normalmente são considerados como o início da Guerra do Ultramar. Por sua vez, o segundo tomo está centrado nas operações militares e políticas que decorriam na Guiné-Bissau e que se acredita terem lançado as bases do fim da ditadura.

Mas o problema deste livro idealizado por Marco Calhorda é a superficialidade do argumento. O autor chama a atenção que se trata de uma obra de ficção, apesar dos personagens e locais serem baseados em dados reais, mas as explicações das várias ações são tão reduzidas, que quando chegamos ao fim do volume, não percebemos o porquê da maior parte do que aconteceu nas páginas anteriores.

Na verdade o tema não é fácil, e apesar de as ações representadas serem simples, o seu motivo, a forma como foram planeadas e o seu fim, são bastante mais complexos. A tentativa de criar uma espécie de Missão Impossível com o imaginário grupo Cobra, não ajuda o argumento, apenas servindo para criar nos leitores um elo de ligação entre os filmes de ação e a BD.

Para além disso a arte deste volume é inferior ao anterior e há várias vinhetas com diversos anacronismos que, apesar de não afetarem o desenrolar da história, saltam à vista dos leitores mais velhos. Por vezes há dificuldade em identificar os mesmos personagens pela fisionomia. Algumas das cenas de ação parecem mais inspiradas nos filmes de Hollywood do que na guerra de 1961-74. O próximo volume será desenhado por Osvaldo Medina, trazendo uma terceira experiência gráfica.

Mas uma falha mesmo grave, é quando os guineenses na aldeia Balanta conversam entre si, não no seu dialeto próprio, mas num português mal falado… Ora os Balantas (que significa “aqueles que resistem”) sempre resistiram ao estado colonial, e de certeza não falavam entre si em português! Talvez uma revisão mais cuidada no próximo volume evite este tipo de erros…

Mas, apesar de vários pontos a melhorar, esta série merece um forte aplauso por pegar num tema tão vasto, sem qualquer tipo de complexo ou preconceito. Espero que o próximo tomo e o próximo volume realmente se concretizem para completar este arco criativo.

Quanto mais não seja, talvez suscite o interesse dos jovens para a descoberta dum período de treze anos da história de Portugal que tantas e tão profundas marcas deixou. Em ambos os volumes encontramos códigos QR que nos encaminham para documentos oficiais relacionados com cada um dos volumes, para descobrirmos mais informação.

Apesar de simples, o argumento cria uma dinâmica de leitura boa, conseguindo manter um nível de interesse suficiente para uma leitura contínua.

Livro com capa dura de cor diferente do anterior volume, com sobrecapa em papel brilhante e com boa encadernação. Miolo em papel acetinado de boa qualidade e com boa impressão. Preço justo para o tipo de livro.

Tempo de leitura:

  • Cobra – Operação Conacri – Tomo 1 – aproximadamente 25 minutos

Uma criação ficcionada, daquela que para muitos foi a razão base do Movimento dos Capitães que viria a derrubar a ditadura portuguesa. Naquele que era o mais temido cenário de guerra, este volume consegue criar o interesse não só para o próximo, como também para tentar saber mais sobre as reais razões deste conflito tão ignorado nos dias de hoje.  

Para quem vive no Porto e arredores, aconselho uma visita à exposição Despojos de Guerra no Centro Português de Fotografia / Cadeia da Relação do Porto, patente até Outubro, para uma visão bem diferente, mas complementar, da referida Guerra Colonial

CoBrA - Tomo 1: Operação Conacri

Marco Calhorda e Zoran Jovicic
Editora: Ala dos Livros

Livro em capa dura com 80 páginas a preto e branco nas dimensões de 22 x 27,5 cm
PVP: 18,50 €

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