As revistas também se abatem – O fim da L’Immanquable!
Roubei o título deste artigo ao conhecido livro de Horace Maccoy “Os Cavalos Também Se Abatem”, obra de 1935, que seria mais tarde superiormente adaptada para o cinema por Sydney Pollack, e que conta o drama de um homem e uma mulher que participam numa maratona de dança durante a Grande Depressão Americana, em que o último par a ficar em pista, ganha um prémio milionário.
L’Immanquable
Mas o L’Immanquable não foi capaz de chegar ao fim da maratona. Parou de dançar em Agosto de 2023, fruto de um conjunto de constrangimentos, sendo os mais importantes o aumento do preço do papel, a falta de assinantes e a baixa procura nos pontos de venda.
Editada por Frédéric Bosser, a revista surgiu em Janeiro de 2011, após um mininúmero de teste editado em Dezembro do ano anterior, que foi distribuído em conjunto com a revista dBD, outro dos títulos editados por Bosser, que começou em 2006 e que para já, vai continuar a ser publicado. Naturalmente o lançamento do primeiro número do L’Immanquable ocorreu no festival de Banda Desenhada de Angoulême e tudo indicava que o projeto teria sucesso, uma vez que registou vendas de 9 500 revistas para o primeiro número e de 9 000 para o segundo.
Com publicação mensal, o conceito da revista era um misto entre a revista com histórias em continuação e a publicação em álbum, uma vez que cada revista publicava várias páginas de meia dúzia de histórias, completando as mesmas em três ou quatro números. Para além disso dava aos leitores a oportunidade da leitura antecipada das histórias, algum tempo antes do seu lançamento em álbum.
Novos Talentos Precisam-se
Seis meses depois de começar, em Julho de 2011, Bosser enviou um e-mail a diversos professores de escolas de BD, informando que procurava novos talentos e abrindo as páginas da revista a pequenas histórias de quatro a oito páginas, pagando o preço de 30 euros por página, o que era bem abaixo do preço do mercado francês da altura. As críticas e os comentários foram imediatos e houve quem sugerisse que a revista mudasse o nome de L’Immanquable (O Imperdível) para L’Impayable (O Impagável). Logo nessa altura se falou da situação financeira da revista e os novos talentos acabaram por nunca surgir…
Também em 2011, o mesmo editor, lançou o número 1 duma série extra (Hors-Série) sobre o tema Verão. Porém a partir do número 2, o tema de todos os números publicados nesta série extra, passa a ser o Erotismo até à última publicação, o número 27, em Fevereiro de 2023.
O Excesso de Desenhos
Em Fevereiro de 2014, novo percalço na sua existência. O Estado Francês decidiu tirar à revista vários benefícios fiscais ligados à imprensa, considerando que a revista tinha pouco material “relacionado com a atualidade”, ou seja, precisava de mais texto e menos desenhos. Entre a hipótese de acabar com a revista no número 39 (Maio de 2014) ou reduzir o número de páginas (e como consequência reduzir as histórias publicadas de cinco para três), a segunda hipótese foi a escolhida.
Para além disso, passaram a ser publicados pequenos resumos de outros álbuns, entretanto publicados no mercado. Como bem lembrou Bosser, o mesmo problema tinha acontecido com a revista Pilote em Outubro de 1978 (36 anos antes!), mas a onda de contestação que autores e leitores provocaram foi de tal ordem, que na altura tudo ficou como estava.
A revista foi continuando a sua publicação com altos e baixos, conseguiu sobreviver à pandemia do COVID-19, e foi publicando várias séries clássicas em conjunto com novos lançamentos, numa total divulgação de vários tipos da BD franco-belga. Se por vezes a qualidade das histórias era algo fraca, outros números houve que justificavam plenamente o preço da revista. Para além disso era uma das muito poucas revistas de banda desenhada franco-belga que se conseguia comprar nas bancas portuguesas.
O Editorial que ninguém quer ouvir
Tudo parecia normal até que, no número 147 (Maio de 2023), surge um texto dirigido aos leitores e leitoras no verso da capa da revista. Nele, Frédéric Bosser informa que os problemas financeiros para a sobrevivência das três revistas que edita são muitos, e que o L’Immanquable é a mas frágil de todas. Para além de pedir o aumento de assinantes, informa que iriam reduzir a distribuição nas bancas, e que também seria organizado um leilão com originais oferecidos por vários autores, como Gibrat, Boucq, Dany, Juillard e Tardi, entre outros.
Esperava assim recolher fundos que permitiriam o saneamento financeiro da editora. A mensagem é repetida no número seguinte (148) e no número 149 não surge qualquer comentário sobre os problemas da revista, fazendo parecer que tal estaria resolvido. Das quatro séries apresentadas, uma delas começava nessa revista.
Eis senão que a meio desse mesmo mês de Julho, Bosser envia um e-mail aos assinantes, informando que a revista terminava no número 150: “150 é um número mais que honroso para encerrar uma grande aventura editorial!”. Também no Instagram surge uma publicação em que o diretor comunica o fim da revista, devido ao aumento dos custos de fabrico e à baixa das vendas.
C’est fini
O fim é tão abrupto que este último número apenas pode ser adquirido no site online e no seu editorial final, Frédéric Bosser esclarece que a revista estava a perder dinheiro e a pôr em risco a existência do título forte da editora, a dBD. A situação é tal que nem sequer têm possibilidade de devolver o valor das assinaturas, sugerindo a transferência da assinatura para uma das outras revistas ou o envio de números atrasados. Das quatro histórias publicadas no último número, duas ficam concluídas, mas outras duas ficam em aberto, com a indicação em pé de página: “Continua…Encontre a continuação desta história no dia X de Setembro, numa livraria, no álbum a publicar.”
Terminou assim uma aventura de 12 anos e 7 meses, que me tinha feito voltar ao velho hábito de ir à banca ver se já tinha chegado a revista e depois ir até a um café sentar-me a ler e descobrir muita coisa que nem se ouvia falar por cá.
Mais uma que foi… Perdemos o Imperdível (L’Immanquable)!
Se não está a ler ou não tem um livro na mão… By Jove, algo se passa!!!
Não conhecia essa revista, mas isso é triste de ouvir. Esperemos que isto não aconteça a nenhuma revista ou editora daqui.